Frei Alberto Beckhäuser, OFM
O grande estudioso da Sagrada Liturgia Dom Odo Casel definiu a Liturgia como
sendo o Mistério do Culto de Cristo e da Igreja. O Catecismo da Igreja Católica
a apresenta como celebração do Mistério pascal. Liturgia tem, pois, a ver com
mistério.
Mas, como entender o mistério? Para uma correta compreensão do que seja a
Sagrada Liturgia é importante termos uma noção do que seja o mistério. Não se
trata do mistério no sentido em que geral se compreende, como algo
desconhecido, de secreto, que não pode ser compreendido, mas no sentido que a
Bíblia, os Padres da Igreja e a Liturgia o entendem. Claro que em qualquer
mistério também continua presente o aspecto do oculto.
Mistério vem do verbo grego myo, que significa estar fechado, estar cerrado ou
cerrar-se, mas sempre alguma coisa que pode ser aberta, que é feita para ser
aberta como, por exemplo, a porta, a janela. A palavra mistério conota sempre
algo oculto, que pode ser revelado. Tem a ver também com culto, com rito, pois, o
rito sempre oculta e revela algo ao mesmo tempo em relação à divindade, a Deus,
a comunhão com Deus.
O mistério se realiza já no próprio Deus. Deus é mistério não só porque a razão
humana não O pode compreender plenamente, mas também porque Deus é
intercomunhão de vida e de amor trinitário. Deus é comunhão de vida e de amor.
Na compreensão da Liturgia a partir da Sagrada Escritura, sobretudo de São
Paulo, mistério é o plano de Deus de fazer outros fora dele participar de sua
vida, do seu amor, de sua felicidade e glória, plano este revelado e realizado
em Jesus Cristo e em todos aqueles e aquelas que acolherem em Cristo este
plano de Deus.
Enquanto este maravilhoso plano de Deus se realiza em Jesus Cristo, ele é
chamado mistério de Cristo.
As diversas revelações e realizações deste Plano nas ações de Jesus Cristo, como
ações salvadoras e de glorificação de Deus, são chamadas mistérios de Cristo. Os
mistérios de Cristo são as diversas expressões da passagem, da páscoa de Cristo
por este mundo, pelas quais ele realiza a obra da salvação, como a encarnação, o
nascimento, o batismo no Jordão, a pregação, os milagres, a transfiguração, os
passos da Paixão e Morte, a Sepultura, a Ressurreição e gloriosa Ascensão ao
céu, o envio do Espírito Santo, na esperança da sua última vinda.
O mistério, para fora de Deus, se realiza, onde Deus e o ser humano se
encontram, onde Deus e o ser humano convivem, onde Deus e o ser humano se
tornam um na comunhão do amor.
O mistério realiza-se também onde as pessoas humanas se encontram no bem,
onde os seres humanos praticam o bem um ao outro, doam-se um ao outro no
amor. O amor conjugal, por exemplo. São Paulo diz que é grande este mistério,
expressando a relação do amor entre Cristo e a Igreja.
Mas, o mistério realiza-se, acontece, sobretudo, através de ritos comemorativos
dos mistérios de Cristo, através das diversas celebrações da Igreja, que
constituem a Sagrada Liturgia. Pelo mistério do culto participamos dos mistérios
de Cristo, ou seja, do mistério pascal. Realiza-se, sensível e sacramentalmente, a
comunhão divino-humana, a exemplo da comunhão divino-humana em Cristo
Jesus. Na Liturgia, Deus continua a encarnar-se.
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